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COLEÇÕES EM MOVIMENTO

A Série Coleções em movimento, é composta por 12 filmes de curta duração assinados por mim, Valéria Martins.
Tenho uma trajetória artística que se caracteriza por ocupações de grande porte e urbanas, privilegiando muitas vezes espaços esquecidos e invisibilizados pelos transeuntes. O cerne de minha pesquisa se baseia no que chamo de corpo-obra, tratando do encontro entre corpos e obras de arte, os ressignificando.  
Possuo um acervo de esculturas e objetos assinados por artistas contemporâneos, entre eles Raul Mourão, José Spaniol, Marta Jourdan, Claudia Herz. Usando as obras como disparador de partituras de movimento vou elaborando junto com bailarines e acrobates um território de subjetividades, onde o improviso e acaso estabelecem uma dramaturgia aberta.

 

No verão de 2021, em meio a pandemia parti com um grupo reduzido de pessoas para a Ilha de Paquetá, bairro do Rio de Janeiro cercado de água por todos os lados, estabelecendo por um curtíssimo período um pacto de protocolos de segurança e criação depois de tanto tempo de confinamento. Faríamos cinema ou vídeo dança ou vídeo arte? Nunca cheguei a uma nomenclatura de consenso.
Com esse movimento a produção de espaço na cidade foi deslocada para o campo audiovisual e um espaço em moldura ficcionado, convocado pela câmera e natureza.

 

Colocamos a partir de então diferentes matérias em relação. Corpos, escultura de grande porte, objetos de ferro, areias de diferentes tipos, pedras de diferentes tamanhos, marés, luz do sol, bichos.
Do elenco formado por seis artistas, duas pessoas já tinham se relacionado com as obras escolhidas e quatro nunca haviam tido contato. Quatro nunca haviam pisado na ilha. Dois estavam em confinamento absoluto até então. Cinco durante toda a quarentena não tiveram contato com a natureza. Três nunca participaram de um trabalho onde o improviso e o acaso são uma das premissas. Uma nunca tinha trabalhado embaixo de sol com materiais brutos como ferro e metalon. Operando nessa matemática partimos para a construção de uma poética onde as particularidades de cada pessoa com sua corporeidade, tempos e pulsões fossem priorizadas.

 

Posto combinados, um elemento se sobrepôs a tudo e todos se tornando protagonista onipresente; a paisagem. A imensa evidência da natureza potencializada nos corpos que foram por meses restritos e abalados em suas emoções e afetos. A paisagem como ode a beleza extrema, perfeita, idílica, bucólica, inquestionável, trazendo em si algo de religioso e inatingível. Marés indo e vindo, pequenas ilhas-bichos, lua, vento.
 

Nada poderia mais ser visto através da percepção ordinária, tudo se tornou disparador de subjetividade. Atravessamos um portal e chegamos ao elo perdido. Ideias prévias foram desconstruídas dando lugar a novas descobertas e locações.
 

Filmamos com certa precariedade e muita disponibilidade amorosa. Usamos uma câmera Black Image Cinema e uma Black Image Pocket. Voltamos da ilha com um HD 6 teras recheado de encantamentos.
Se iniciou então uma nova etapa; a edição. O momento das escolhas e do desapego. Do desenho. Do fio. Muitas possibilidades para uma geminiana navegando muito recente nesse mar tecnológico digital. Entrar fundo no estatuto da imagem tendo como mediação não mais o contato vivo e pulsante com o público e sim, a tecnologia evidenciando com sua profusão de artificialidades uma nova constituição de quadro-paisagem. Doze filmes novos dentro dos filmes que fizemos na ilha.
REPARAR – EVOCAR – PLANTAR – FORJAR – ESQUECER – HABITAR – ENCARNAR – DESATAR – AMPLIAR - ENVOLVER – VIBRAR – CORRENTEZA. Escolhi propositalmente um substantivo para nomear o último filme da série, um testemunho do desague catártico que tudo isso significou.

 

Ainda estou me adaptando a esse novo devir digital. As obras estão no mundo, rompendo fronteiras, mas uma solidão ainda me habita por não ter o calor da troca encarnada com o público. Sigamos nessa nova era desatando nós.

CONCEPÇÃO E DIREÇÃO: VALÉRIA MARTINS
COLABORAÇÃO ARTÍSTICA: DANIEL CASTANHEIRA
DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA: RENATO DE PAULA
ESCULTURA DESCANSO DA SALA: JOSÉ SPANIOL
ELENCO: CAROL CONY, DANIEL CASTANHEIRA, WAGNER CRIA
EDIÇÃO DE IMAGEM E TRATAMENTO DE COR: RENATO DE PAULA
DESENHO DE SOM E TRILHA SONORA: DANIEL CASTANHEIRA
FIGURINOS: VALÉRIA MARTINS
DESIGNER: ROMA ROMAMA
FOTOS: CABBET ARAÚJO
ASSISTENTE DE DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA E 2º CÂMERA: VICTÓRIA ROQUE
COMUNICAÇÃO EM REDES SOCIAIS: MARCELO MUCIDA
MONTAGEM DA ESCULTURA: DODÔ GIOVANETTI
MIXAGEM DE SOM: ABEL DUARTE
PRODUÇÃO: JULIA KARAM, VINICIUS MARTINS
CONTROLER: CIDA DE SOUZA, RAY FARIAS

Valéria Martins

Atua há 36 anos na área de cultura com consolidada carreira em linguagem de movimento e

projetos multidisciplinares. Em 2009, iniciou uma pesquisa autoral convergindo artes visuais, dança, circo

e sonoridade que resultou nos espetáculos-intervenções urbanas- instalações.

Por 23 anos também foi diretora artística, de produção,figurinista e empresária da Intrépida Trupe.

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Rio de Janeiro

maio 2021